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Relato do escritor e ilustrador Renato Moriconi sobre sua experiência no projeto Literatura na Cesta Básica.

Cheguei cedo para minha participação na atividade literária com as crianças e adultos do projeto da Cia Circo de Trapo. Pude acompanhar cada detalhe: da preparação da praça para receber os leitores à forma como as pessoas eram convidadas para participar do evento. A manhã linda de sol, com um cheiro delicioso de pastel, cooperava para que o evento fosse agradável. Eis uma coisa boa, nova: um programa de incentivo à leitura bem no meio de uma feira de rua. Não tinha visto isso ainda. Achei muito bom! Creio que os livros não precisam ficar restritos aos lugares silenciosos, que demandam certa formalidade e reverência. Naturalmente é bom um certo silêncio para se concentrar, mas a gritaria dos vendedores não causou nenhum incômodo. Juntaram-se às vozes dos feirantes os cantos dos passarinhos e o chiar das folhas nas árvores, que também nos forneceu uma sombra muito agradável. Minha atividade foi basicamente uma fala sobre meu trabalho de autor de livros. Mostrei alguns de meus textos e algumas de minhas imagens. Descobri com as crianças mais atentas novos significados em detalhes escondidos em ilustrações de meus livros-imagem. Isso sempre ocorre. Certas imagens são tão abertas ao leitor que muitas vezes a interpretação que eu quis passar muda de sentido, criando-se assim uma nova narrativa. Foi uma boa conversa. Uma troca de visões sobre uma única narrativa. Após ler alguns de meus livros para eles, mostrei os protótipos dos livros, também chamados de bonecos. Mostrei os rascunhos das imagens dos livros que eles tinham visto impressos: o “Bárbaro” somente em traço preto; e “Telefone Sem Fio” cheio de rabiscos e manchas coloridas. Terminei minha participação fazendo o desenho de um dos retratos contidos nesse último livro. Esse é um momento muito gostoso, pois enquanto fico com os olhos focados no papel, que recebe os traços que compõem a imagem, ouço as vozes de surpresa das crianças descobrindo cada detalhe que toma forma traço após traço. Para fazer esse desenho, usei um lápis chamado dermatográfico, que é um lápis grosso que permite uma boa visualização dos traços para quem está longe do papel. Desenhei bastante com ele naquele dia, até a ponta sumir. Ao contrário dos lápis comuns, que utilizamos no dia a dia, esse não precisa de apontador. Ele tem um fio que corta o seu invólucro, e que após cortado, deve ser puxado, revelando milagrosamente uma nova ponta, prontinha para ser usada. De tudo o que falei naquele dia, nada foi mais mágico para as crianças do que ver aquele lápis estranho, do tio fazedor de livros, ganhando uma nova ponta. Eles bateram palmas para o lápis e eu fiquei feliz, pois o lápis merece todo o respeito mesmo, pois ele me ajuda a criar livros e a contar histórias. O cheiro do pastel estava muito bom e a hora, avançada. Assim que acabei minha atividade, fui à barraquinha e pedi um de frango com catupiry, mais um copo de caldo de cana. Saí satisfeito de barriga e de alma.

Renato Moriconi é artista plástico, graduado em Artes Plásticas e pós-graduado em Design Gráfico. Dedica-se às artes gráficas desde 1994 e tem aproximadamente 50 livros publicados no Brasil, México, França, Itália e Coréia do Sul. Recebeu os prêmios “melhor livro-imagem” em 2011 e em 2014, e “melhor livro para a criança” em 2012 pela FNLIJ – Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil. Recebeu também o troféu Monteiro Lobato em 2014 da Revista Crescer e o prêmio de melhor ilustração editorial no 13º Salão Internacional de Desenho para Imprensa de Porto Alegre. Recebeu o Jabuti de “ilustração infantil” em 2014.

 

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